Sheldon, eu entendo você

Meu compromisso aqui, a princípio, era fazer pelo menos uma atualização semanal. Essa semana eu fiquei mais de dez dias sem postar, mas eu tenho um bom motivo: LOST. Sim, finalmente eu segui o conselho de 9 entre 10 amigos meus e vi toda a série. Agora que eu acabei, meus dias estão novamente sem propósito e posso voltar à programação normal. Além disso, sei que uma das minhas pautas futuras será séries em geral. Eu preciso comentar algumas coisas que tenho assistido e, claro, preciso falar de Lost e de como minha opinião foi completamente mudada, como se deu esse processo. Mas hoje não é este o assunto. Então, aos trabalhos.


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Querida e amada Av. das Torres, obrigada.



Como se não bastassem ônibus lotados onde se observam coisas bizarras, os momentos de educação física constrangedores na escola e outras coisas mais, aqui vai mais um trauma. Sim, pois vocês não sabem como eu sofro. Pode parecer que eu estou pla
giando o último post do Breno, mas eu realmente tenho pensado em contar minha experiência como aspirante à motorista que eu não sou. O assunto me veio desde que minha irmã chegou em casa derrotada por ter reprovado no teste do DETRAN na parte prática. A coitada nem chegou a fazer o teste de rua porque bateu no protótipo em sua primeira tentativa de baliza. Mas, ao contrário de chegar amaldiçoando o mundo e colocando a culpa no seu avaliador, ela ria. Ria porque, antes de fazer o teste, foi ter aquela aulinha de revisão antes, aquela coisa que a gente chama de “estudar na hora da morte”. Treinou a tal baliza 5 vezes, não errou uma. O instrutor dela, então, disse que eles deveriam ir treinar a rua, pois ela tinha mais dificuldades lá. E ela errou a baliza.

A primeira frase que se lê no meu “
about me” do Orkut é uma que eu escutei no sitcom The Big Bang Theory, dita pelo Sheldon: I’m clearly too evolved for driving (eu sou muito evoluído para dirigir). Sim, esse negócio de embreagem, freio, marcha, acelerador, dá sinal pra esquerda, vira o volante duas vezes, sinal da direita não é pra mim, definitivamente. Eu não sei como alguém consegue raciocinar a 70 km/h sabendo que é você quem está controlando todo aquele trambolho de quatro rodas.

Eu juro que fui uma aluna muito dedicada na autoescola, estava até empolgada pra conseguir minha carteira de motorista e achava que me daria muito bem nisso. Eu era uma ótima aluna nas aulas teóricas, pegava o cronograma e estudava a matéria antes da aula, depois revisava em casa e tiravas notas ótimas nos simulados. Cheguei até a tirar um raríssimo 10 na prova de mecânica, um fato aparentemente inédito, principalmente se tratando de uma mulher. Sempre fui um pouco mais “masculina” do que minha mãe sonhou pra uma filha (gosto de futebol, computador, odeio andar o dia inteiro pra comprar 5 peças de roupas e sempre preferi me sujar de terra no quintal a brincar de casinha com as bonecas). A lógica me dizia que eu ia pegar num volante e sentir que nasci pr’aquilo. Talvez tenha sido essa minha ruína: não ser tão perfeita quando eu esperava ser. Mas eu estava muito longe de ser infalível. Na realidade eu fui uma catástrofe mesmo.


As provas iniciais foram ridiculamente fáceis pra mim. Na psicotécnica eu simplesmente me sentia subestimada, por favor. Aquilo insultava minha capacidade intelectual seriamente. E a teórica eu completei em contabilizados 18 minutos, fui a segunda a sair da sala de prova. Tudo certo, agora era só correr pro abraço e marcar a prática e... Nunca fiz a prática.


Sim, eu desisti de dirigir antes de tentar. Notei que a coisa não seria conforme o planejado desde a primeira curva que eu tive que fazer com o carro: eu não tinha
noção do quanto eu precisava virar o volante para não invadir a calçada em frente. Minha inteligência espacial simplesmente pulou essa lição, havia apenas o vazio onde deveria existir a capacidade de dirigir, sério. E depois ainda queriam que eu aprendesse a pisar no freio, na embreagem, trocar marcha. Tudo ao mesmo tempo. Há, há, há. Querido, eu não conseguia virar um volante nas primeiras aulas, imagina se eu ia automatizar esse ritual todo no meu cérebro. Daí chegou a tal Avenida das Torres (uma via rápida de Curitiba) e eu percebi nesse dia que nunca seria motorista quando o instrutor me falou, em cima da hora, enquanto eu estava a quase 70 km/h, que eu deveria pegar o retorno que estava a poucos metros de mim. Eu senti um desespero enorme em questão de segundos e prometi que, se saísse viva de lá, nunca mais sentaria no banco do motorista na vida.

Simplesmente não dá. Eu não consigo fazer parte da classe motorizada. Não é pra mim buzinar porque fulano lá na frente está dirigindo devagar, ou ouvir grosseria por estar dirigindo devagar e obedecendo às regras que todo motorista dotado de licença deveria ter aprendido na autoescola. Pra se ter noção, me xingaram quando eu estava em uma das minhas aulas de rua, dentro de um carro que é pintado justamente para deixar claro que a pessoa ali dentro está fazendo
AUTOESCOLA, ou seja, aprendendo. Se os ignorantes motoristas não têm este tipo de discernimento, então muito obrigada, mas eu não quero fazer parte desse clube. Sem contar que uma possível reprovação no teste prático seria simbolicamente um carimbo de “incapaz” bem no meio da minha testa e eu não estou preparada para lidar com isso. Até enquanto eu puder, continuo pegando Interbairros V lotado e vou torcendo para que minha irmã mais nova consiga passar em sua segunda tentativa e, futuramente, possa me dar uma carona.

Cuida que o filho é (a)teu


Warning:
Este post soará revoltado, depressivo e, para alguns, pode chegar a ser revoltante. Há grandes chances, também, de que ele seja longo. Certamente existe a possibilidade de você achar que eu preciso me tratar ou rezar. Ou ambos. Não duvido que a primeira alternativa tenha um fundo de razão. Da segunda, já desisti sem nunca ter tentado. Não conscientemente.
Considero ainda importante dizer que este espaço é um desafio pessoal. Eu sempre pretendi criar, através de coisas corriqueiras que observo e vivo, posts leves, agradáveis e, se possível, engraçados. Então peço desculpas a quem entra aqui procurando por isso. Juro que vou tentar não repetir o episódio, mas desta vez acredito que não haja muito do que rir. Mas como senso de humor é algo bastante subjetivo, fique a vontade se achar que deve.



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Mesmo que o @brunoessm tenha me alertado, vou correr o risco de perder leitores antes mesmo de tê-los conquistado: não acredito em Deus. Pronto, falei. Tá aí ainda? Não me odeia? Não acha que eu preciso encontrar Jesus no meu coração, que eu sou uma alienada e que no dia do juízo final eu ficarei do lado de fora dos portões do paraíso com um olhar piduncho para os anjinhos recém-chegados no tempo do Senhor? Então continua comigo que eu explico.

Minha mãe tentou me fazer gostar de religião, coitada. Quando eu era criança, decorei todas as orações católicas existentes, rezava o Santo Anjo (do Senhor, não da Xuxa, hehehe), o Pai Nosso, a Ave Maria, Santa Maria, Creio em Deus Pai (é assim que se chama? rs) de cor. Aliás, só me deixaram ser transferida da igreja em que eu fazia catequese pra uma próxima da casa para a qual eu me mudei mais tarde por isso. O padre não levou muita fé em mim; eu disse alguma bobagem, mas sabia as orações todas. Ponto da minha mãe, não da igreja, veja bem. Aliás, o padre disse que eu seria reprovada e atropelada pelo ensino avançado de seus professores se fosse estudar lá. Muito doutrinador e cristão ele. Se Deus ensinou ele a falar assim, nem quero ver do que o Diabo é capaz. Fuck him, ele não seria meu professor mesmo. Eu só era obrigada a ir às missas que ele ministrava todos os domingos depositar meu nome na caixinha de presença dos catequisandos ou eu reprovaria. Sim, as presenças nas missas eram contabilizadas, quase reprovo (quem duvida que reprovar na igreja é possível, pergunte à minha irmã, sem brinks).

Completei a catequese, fiz a confissão (única e última da minha vida, obrigada), tomei comunhão e fui fazer crisma (sem confessar de novo, faço questão de frizar) porque fui igualmente obrigada. Eles não dariam meu “diploma” de primeira comunhão se eu não fizesse. Isso me parece até engraçado hoje, sabe. Como assim? Diploma? Cristianismo e catolicismo agora precisam ser provados por autorização do padre, Deus não vê nada disso, oook. Mas não, não foi nada disso que fez de mim uma ovelha perdida do rebanho, mesmo que eu considere tudo suficiente pra desistir de uma instituição cheia dessas falhas.

Eu nunca ouvi o chamado, aquela chama que acende no coração e diz maravilhoso, conselheiro, Deus forte, Pai da eternidade e Príncipe da paaaaaaaaaz. Isso tudo nunca fez sentido, eu ia aos meus estudos religiosos porque era um requisito social e obrigação na condição de filha em que eu me encontrava. Duvida? Experimente dizer no meio de um grupo de pessoas que você não tem religião ou não acredita em Deus pra ver. Todos passarão a olhar você com pena na melhor das hipóteses e tentarão exorcizá-lo na pior.

Quanto mais eu estudava, menos eu me identificava com esse universo. Quanto mais eu sei e vivo, mais certeza eu tenho de que estamos por nossa própria conta e risco. Só para exemplificar, chegou até mim o relato sobre um garoto de 20 anos que descobriu ter um tipo de câncer. A doença se alojou em sua espinha dorsal, comprimindo a coluna e, em poucos meses, ele estava em uma cadeira de rodas, definhando, apenas esperando a morte. Foi-lhe dada apenas a opção de esperar por ela em casa ou no hospital. Então, no enterro, chegarão aquelas beatas conformadas dizendo que “agora ele descansou”, “foi melhor pra ele”. Melhor pra quem? Descansar de que? Um garoto aos 20 anos de idade não está cansado de nada, ele tem sonhos, ele quer realizá-los. Não consigo encontrar um lado bom disso e nem ver nenhuma mensagem divina ali. Perguntassem a esse garoto o que ele queria e ele certamente responderia que gostaria de terminar a faculdade, ter uma namorada, casa e filhos. Então não me venham dizer que Deus escreve certo por linhas tortas se eu não consigo enxergar o que isto tem de certo. Isso é triste, trágico e lamentável. Esse garoto certamente não merecia nada disso.

Isso não me revolta no lado espiritual da coisa, pois, como eu disse, nunca fiz questão de acreditar em nada dessa conversa. O que fatos assim me dizem é que somos seres biológicos, sujeitos a esse tipo de mal. Isso é natural. Eu fico muito mais conformada sabendo disso do que tentando encontrar uma explicação divina ou um conforto na Bíblia. Se eu acreditar que Deus realmente existe e é responsável por esse tipo de coisa, teria que odiá-Lo. Prefiro chamar de “sorte” ou “azar”.

Outro argumento para que ninguém pense que eu me apego a desgraças para negar a Deus? Pra mim, religião é algo criado pelo homem para explicar coisas que sua racionalidade privilegiada não é capaz de compreender sozinha. Cai um raio e queima uma árvore, é Caramuru e pronto. O mar está agitado, os navios afundam, é culpa de Poseidon/Netuno. Eu sei que religião não é racional e não é possível contestá-la com razões científicas, afinal fé não se explica. Mas será que dá pra entender o meu ponto de vista? Os povos antigos tinham uma fé em vários deuses, cada um designado a uma desgraça diferente, mas isso tudo é hoje visto como mito e tem caráter muito mais folclórico (e, olha, muito mais interessante que criar um único deus barbudo que fica sentado nas nuvens olhando tudo, heim). Aliás, isso acontece ainda hoje. Quantas religiões e deuses existem hoje? Cada um tem o seu, então eu chego à conclusão de que alguém TEM que estar errado, ou existem também vários céus e infernos, cada um designado a quem leu (ou não) um livro sagrado diferente. Quer dizer que também existe burocracia entre os deuses? Seria engraçado, né. Você morre, chega num lugar com vários guichês e pega uma senha. Depois de horas esperando ela andar (santos têm atendimento preferencial), é recebido por um funcionário mal humorado que diz:

- Senhora, a senhora está na fila errada. Esta aqui é a fila dos budistas, a fila dos católicos fica ali ao lado da fila dos islâmicos.

Não dá, não me entra na cabeça esse tipo de coisa. Somos animais, talvez favorecidos por poder raciocinar e, consequentemente, filosofar. Então, sem encontrar uma razão para o trovão e a chuva, inventamos entidades que cumprem sua função de preencher essa lacuna existencial. E o mundo se apega a isso porque simplesmente é incapaz de viver consciente de que é mais um tipo de vida no planeta.

Eu posso estar cometendo uma heresia para alguns, mas tudo o que eu pensei até hoje me trouxe a este presente. E se Deus existe mesmo, Ele vier me pedir satisfações e eu tiver que prestar contas do meu ceticismo, falo sem hesitar: pois eu Lhe digo que pai é quem cria, não quem coloca no mundo. Se não podia ser responsável por todos, por que jogou tantos deles aqui?

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