Então é Natal...

Eu comentei ontem com meus amigos revolucionários que não queria transformar este blog num espaço de reclamação, mas desta vez foi inevitável. E eles ainda disseram que posts indignados são os melhores, então ótimo. Toma reclamação.

* * *

São exatamente 19:42 (horário de Brasília, de verão...), uma terça-feira. Eu tomei meu banho refrescante e bem-vindo nestes tempos de aquecimento global em que nem Curitiba escapa de temperaturas altas (pra mim, que sou fresca, segundo dizem as más línguas que insistem em me ultrajar), estou de pijama, com o cabelo molhado, dividido em quatro partes, que é como eu faço para secá-lo. Estou bastante próxima de ser confundida com a Dona Florinda, eu di
ria. Minha pequena cachorrinha está deitada no tapete de crochê estendido aos pés da minha cama, olhando para a porta, esperançosa de que alguém venha libertá-la do seu convívio forçado comigo (vide foto abaixo). Para entender como nós duas viemos parar em cárcere privado, continue lendo este post.


Dudy says: E agora, quem poderá nos defender?


Cada família tem seu ritual nesta época do ano. É tempo de árvores enfeitadas, de luzinhas em volta de toda a casa (abraços solidários ao horário de verão, que serve justamente pra economizar energia em horários de pico), de amigo secreto, nozes, castanhas, cânticos natalinos, lojas fervendo nos grandes centros, galera recebe o 13° salário e gasta como se não houvesse amanhã, as crianças entram em férias, muito calor, insetos se proliferando, confraternização com o próximo. Esta última parte é a que eu mais odeio de longe: confraternização. E isso, nesta época, significa: NOVENA.

No que consiste uma novena, caros padawans? Ah, isto é um rito à parte. Minha abençoada mãe vai ao centro da cidade, compra velas, castiçais, monta presepinho, coloca o menino Jesus em seu ninho de palha, enche as bombonieres de Sonho de Valsa, leva a Bíblia que normalmente fica num aparador no corredor para a sala e aguarda. Aguarda os sinos badalarem as 19:30 para receber em casa pessoas, sempre mulheres, vizinhas do que elas chamam de “comunidade” somente uma vez por ano ou nos bingos da igreja. Esperto é homem que confraterniza no bar, logo após o trabalho mesmo. E vocês pensam que essas tias gostam disso? Não! Elas só comparecem porque não é socialmente recomendável fugir de compromisso de que ninguém tem coragem de dizer que não gosta. Eu tenho, eu digo, eu não vou! Eu já nem lembro qual a última vez em que eu fui à missa, acham que eu vou frequentar novena com um monte de vizinha que só o faz por obrigação de cara amarrada? Pior: é minha mãe quem organiza as novenas aqui do bairro.

Mas minha mãe não tem coragem de admitir para os vizinhos que tem uma filha perdida que não encontrou Jesus. Então o que acontece? Também se trata de um rito, anualmente repetido. Minha mãe mostra as coisinhas que adquiriu feliz da vida, e eu só “opa, legal, heim” (fora estourar os plásticos bolha em que vieram os souvenires religiosos). Então, quando vai chegando a hora dos convidados chegarem, ela olha ameaçadoramente para mim e minha irmã e diz:

- Vocês vão descer pra rezar? Tem que ir alguém pra não ficar chato, né?

Por que minha mãe ainda me pergunta isso? Eu só queria uma razão, um fato de demonstre que haja alguma chance neste mundo de eu passar uma hora lendo livrinho de catequese e cantando músicas religiosas (em nome do Paaaaaaaaaai, em nome do Fiiiiiiiilho, em nome do Espírito Santoooooo, estamos aquiiiiiiiiiiiiiiiii... Meu coração é para tiiiiiii senhooooooOOooOOooorrrr...). Eu não sei por que ela simplesmente não vai lá e diz que suas filhas não gostam dessas reuniões (e eu não vejo os filhos dos vizinhos aqui em casa, fica a denúncia). Sobra pra quem? Ponto pra quem disse “sua irmã”. Sim, a coitada, cheia de trabalho de fim de semestre na faculdade, precisa parar tudo o que estava fazendo e ir lá, afinal coube a ela a tarefa de amenizar a vergonha pela filha desgarrada aqui. Mas tem uma condição pra eu não ouvir sermão e poder ficar aqui na minha: preciso cuidar da pobre Dudy, a cachorrinha, me trancar no meu cativeiro e fingir que eu não existo enquanto alguém ainda estiver na sala (só minha mãe pra achar que ninguém nunca notou que eu sempre estou fora de casa em dia de novena). Já comentei por aí que um dia vou chegar lá com meus livros de Harry Potter e dizer que preciso rezar virada para Hogwarts pelo menos uma vez por ano! Também já me aconselharam a descer as escadas na posição de ponte e girar a cabeça 360°. Juro que fiquei tentada.

A liberdade de culto religioso – ou não – consta na Declaração dos Direitos Humanos e é um direito constitucional! Assim como as senhoras que neste momento estão na minha sala rezando têm o direito de ler seu livrinho e participar de novenas, eu tenho o direito de não participar, de ser agnóstica ou atéia. Eles não podem me processar por isso; eu posso processar alguém por me manter em cativeiro e ferir minha liberdade de ir e vir. Enquanto isso, estou aqui, com meu cabelo secando (ele vai ficar horroroso amanhã, OMG!), observando minha pobre cachorrinha olhar tristonha para a única saída, esperando o Salvador terminar a conversa lá embaixo e depois vir tirá-la daqui.

Quem é o criminoso, minha gente? Ah, mas é tudo em nome de Deus, da comunidade, da vizinhança. Amém.



PS: Assim que estava terminando de editar a foto que ilustra este post-denúncia, minha mãe entrou no meu quarto dizendo "nossa, como tá calor aqui". Jura, mamy? Deve ser porque essa porta ficou trancada por uma hora enquanto você rezava lá embaixo. Mas deixa eu ir secar meu cabelo.

19 comentários:

Breno Ribeiro disse...
1 de dezembro de 2009 às 15:03

A parte das vizinhas chegando pra rezar me lembrou um filme "Little Children", mas elas iam ler livros mesmo. rs

Só posso lamentar por você e agradecer pela minha mãe não ser religiosa a esse ponto.

Giovanna disse...
1 de dezembro de 2009 às 15:04

DUHSAADSHUUHSDSADHUASDHU Morri

Minha avó também tem essa vergonha de mim, porque quando ela consegue me arrastar pra uma missa (normalmente quando alguem morre) eu nunca participo da comunhão, ou então reclamo do padre mandando a gente sentar e levantar o tempo todo estilo brinks de "morto e vivo".


Ai e como eu odeio o Natal.

João Rodrigo disse...
1 de dezembro de 2009 às 15:05
Este comentário foi removido pelo autor.
Arthur disse...
1 de dezembro de 2009 às 15:06

Ri pra cacete e angariei o apoio da minha mãe católica ao seu favor.

João Rodrigo disse...
1 de dezembro de 2009 às 15:08

Eu achava que a minha família tinha problemas religiosos, mas você acaba de abrir meus olhos.

Reivindique seus direitos e abaicho a imjustissa \o/

Boa Sorte com sua "Nove[l]a". =')

F@bielle disse...
1 de dezembro de 2009 às 15:11

IUhuiadsgdsuyads. Mêo, minha mãe não é religiosa assim, ainda bem. Ninguém da minha família é. Se eu não acreditasse em Deus, creio que não teria nenhum problema aqui em casa. Amém.

Rebeca disse...
1 de dezembro de 2009 às 15:36

Meus avós são muito religiosos, mas eles já sacaram que eu e meu primo não somos, então eles até reclamam da gente não ia à missa sequer no Natal e depois deixam quieto, hahaha.

Mas como eu costumo passar o Natal com o lado da família Espírita, ainda que todos nós sejamos Cristãos, não fazemos praticamente nada diferente quanto aos hábitos religiosos.Acho digno.

Então eu realmente lamento por você, porque essa brinks de religião pode ser levada mais de boa em alguns casos, rere.

Daniel disse...
1 de dezembro de 2009 às 15:52

HAHAHA!

Isso geralmente acontece aqui no mês de Maio. Minha mãe também organiza novenas e sempre tem uma aqui em casa.
Eu vou à missa, mas não participo de novenas.
Meu pai também é bem religioso e frequenta um grupo de orações na igreja. Ele agora também traz - ou trazia. Faz tempo que não tem novena aqui em casa - o pessoal para cá também.
Minha irmã está namorando, meu irmão na rua e eu em aqui, em casa. Sobra pra mim! rs
"- Vocês vão descer pra rezar? Tem que ir alguém pra não ficar chato, né?"
Já ouvi isso várias vezes, mas a única diferença é que eu não preciso descer. Só é abrir a porta. :P

Gabriel Vilela disse...
1 de dezembro de 2009 às 16:02

Ai, odiava e odeio novenas, apesar de não existir mais aqui no bairro. Quando era menor vivia na casa da minha vó e pra vc ver como vc sai no lucro, todo mês tinha uma reunião de velhinhas na casa da minha vó para, entre outras coisas, rezar e cantar para Deus. O que o pobre menino Gabriel fazia? Ia pro quintal se divertir com brinquedos e matando insetinhos, enquanto perdia minha única razão de vida, Rá-Tim-Bum :(

Sinta-se feliz depois desse meu depoimento.

PS: se eu fosse vc desceria as escadas de ponte.

Unknown disse...
1 de dezembro de 2009 às 17:51

"á comentei por aí que um dia vou chegar lá com meus livros de Harry Potter e dizer que preciso rezar virada para Hogwarts pelo menos uma vez por ano!"


HIOSHOIDHSAIODHOISAHD morri

antigamente aqui tinha novena de familia!
os adultos ficavam rezando e os primos iam ver tv e jogar videogame,então adorava novena. ahhaa

Cauê disse...
1 de dezembro de 2009 às 18:45

Lanço o desafio de pelo menos na próxima vez você gritar alguma coisa em latim. UDSUHUDHS muito bom o post, ri demais.

E olha, mãe é quase tudo igual. A minha chorou quando eu contei no que acreditava, ou no que não acreditava.

Sempre ótimo, querida. Beijo.

Bruno disse...
2 de dezembro de 2009 às 03:12

Atualizei tres vezes e fui o visitante 1000!!!!!!!!!!!!!!!!

Breno Pires disse...
2 de dezembro de 2009 às 07:55

"á comentei por aí que um dia vou chegar lá com meus livros de Harry Potter e dizer que preciso rezar virada para Hogwarts pelo menos uma vez por ano!"

Vou la com vc, rezar virado pra Hogwarts é uma coisa basica de natal rsrsrssssr

Acho este trem de obrigar o povo a resar um saco
Eu nao sou mais catolico, por isso eu sofro as vezes com visitas da igreja na minha casa em dias que eu nao tou nem um pouco afim
Entendo a sua dor
Mas pela minha sorte as minhsa duram apenas alguns minutos, entao nem reclamo (muito).

Fabio Martins disse...
3 de dezembro de 2009 às 10:35

Nasci numa familia budista. Nem sei o significado disso. Mas, meu... que tortura! Essa atitude da sua mãe me lembrou o Tio Valter. kkk

Coitada da sua irmã. ó.ò

Que irmã você, hein... nem pra livrá-la dessa.

Hugo disse...
4 de dezembro de 2009 às 17:19

Não te conheço mas resolvi comentar...Adorei o post
KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK'
Você escreve bem :)

v. disse...
8 de dezembro de 2009 às 16:47

Nunca tive esse problema. Meus pais eram católicos não-praticantes quando eu nasci (na verdade, acho que eles diziam ser isso por terem crescido com pais católicos "de verdade", mas OK), mas sequer me batizaram.

É, é verdade. Eu nunca fui batizado, porque queriam que eu crescesse para definir qual seria minha religião, quais seriam os eventuais padrinhos, etc. Eu nunca quis, então nem sei como é a tal da água benta.

Meus pais sempre foram bastante críticos, leem e são fãs de Saramago (meu pai acabou de ler Caim recentemente, até), então não tenho estímulo algum para seguir coisa alguma no Natal, que dirá no resto do ano.

Layanna Maiara disse...
9 de dezembro de 2009 às 05:36

HAHAHAHAHAHA! Coitadaaa! Na boa, acho que ninguém deve ser constrangido a fazer algo que não queira! Ainda mais quando se refere a algo espiritual! É aí que tá o problema, precisamos deixar de sermos religiosos já! Religião é só uma convenção! Duvido que Jesus ficava chamando os outros pra rezar ou coisa do tipo. Ele ensinou a orar justamente para que cada um fizesse a sua oração na hora oportuna. Sem tradições ou costumes!

Amei o post!

Blog Dri Viaro disse...
10 de dezembro de 2009 às 05:07

oi, passei pra conhecer o blog e desejar bom dia
bjss

aguardo sua visita :)

Israel Rossoni disse...
13 de dezembro de 2009 às 18:33

Nossa muito bom, adorei e tbm natal já perdeu a graça virou uma mera data comercial....

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